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Amazonas lidera as estatísticas de crescimento de violência contra a mulher

Segundo o Anuário de Segurança Pública, em 2022, houve aumento no registro de casos de violência doméstica.

Por Álvaro Alves e Juliana Ferreira*

Especial para portalfalcon.com

Publicado em 22/10/2023


“Eu sentia muito medo, era proibida de sair de casa, toda vez que ele saia, escondia o roteador de internet, para que eu nem conseguisse me comunicar com meus parentes. Além das agressões psicológicas, eu também sofri agressões físicas, apanhava mesmo, e minha filha de quatro anos via tudo, foi uma época muito complicada da minha vida.” O relato é de Isadora Souza, uma jovem mulher que optou por não ter seu nome real revelado e que passou por violência doméstica até receber ajuda de uma vizinha.


Em 1983, o povo brasileiro foi surpreendido pela tentativa de assassinato de Maria da Penha Maia Fernandes, pelo próprio marido duas vezes, ficando paraplégica na primeira vez do crime. O caso ganhou uma grande repercussão devido à violência sofrida pela vítima, mostrando a realidade de várias mulheres brasileiras que sofrem violência doméstica. De acordo com a pesquisa Visível e Invisível, feita pelo Fórum Brasileiros de Segurança Pública e Datafolha, a casa continua sendo o local mais perigoso para as mulheres, visto que 42% das entrevistadas relatam que sofreram violência na própria residência.   


A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos condenou o Brasil durante o caso Maria da Penha, que colocou em evidência a falta de apoio e medidas protetivas do Estado para as mulheres que estavam na mesma situação. Posteriormente, a Lei Maria da Penha foi sancionada em 07 de agosto de 2006. A lei tem como principal objetivo proteger e auxiliar todas as mulheres em situação de violência, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual e renda, além de incluir mulheres transexuais e travestis.  


O abuso psicológico acaba sendo o início dos atos violentos, porém, os sinais muitas vezes são ignorados pelas parceiras dos agressores e pela sociedade, pois mesmo agora, a violência psicológica é atribuída como sendo algo normal para o relacionamento. Atos de humilhação, desvalorização moral em público ou em privado, que diminuem a autoestima da vítima, além de desencadear diversas doenças psicológicas como depressão, ansiedade, distúrbios de cunho nervoso, entre outras.  


O transtorno de estresse pós-traumático é um dos mais comuns presentes nas vítimas de violência doméstica, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), e acontece quando o paciente vivencia um episódio concreto ou ameaça de morte, lesão grave ou violência sexual de quem testemunha presencialmente ou é exposto de forma repetida ou extrema aos detalhes do evento. Conforme compartilhei nas orientações, é preciso ajustar os parágrafos anteriores para não ficarem no estilo de texto de relatório, sem fontes.

 

A psicóloga Taís Renovato Oliveira do Santos explica que esse tipo de distúrbio apresenta como principais sintomas as lembranças intrusivas do evento traumático. “Flashbacks do acontecimento causados por gatilhos, pesadelos recorrentes, dissociação, distanciamento e isolamento da vítima, ainda podendo apresentar alguns episódios de agressividade. No dia a dia, esses sintomas afetam a paciente fazendo com que o mesmo não consiga seguir em frente, pois o trauma o faz reviver a situação traumática”, diz. Em vítimas de violência doméstica no Brasil, em cada cinco mulheres vítimas do crime, três apresentavam algum sintoma do transtorno. O tratamento para este transtorno envolve psicoterapia e medicação. Mas afinal, o que se encaixa como violência doméstica? 

A violência pode ocorrer antes, durante e até mesmo após o fim da união entre o casal, visto que, segundo o Instituto Patrícia Galvão, 34% das mulheres declaram terem sido obrigadas, após o fim do relacionamento a bloquear o contato e/ou mudar de telefone, além de 15% ter registrado um boletim de ocorrência. Na era digital, é apresentado uma nova forma de disseminação de violência contra as mulheres, visto que além do ato ser útil fácil, e rápido, ainda oferece o anonimato ao usuário.  


De acordo com o Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença do Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP), a internet se tornou um mecanismo para a perpetuação de violência contra as mulheres, a cada dia aparece um novo tipo de categoria visando difamar, humilhar e machucar vítimas. No caso da violência doméstica, o ambiente virtual é utilizado por agressores para divulgar dados, mídia e informações íntimas da mulher, como a pornografia de vingança, além de pressionarem as mulheres em redes sociais e aplicativos de mensagens, fazendo a violência se estender por todos os lugares, causando estresse e medo nas vítimas.  


Infelizmente, a violência contra a mulher é uma crescente no país inteiro. Segundo o Anuário de Segurança Pública, em 2022, houve aumento nos casos de violência doméstica registrados, o número cresceu de 237,596 em 2021 para 245,713 em 2022. O estado do Amazonas lidera as estatísticas de crescimento com 92%. O que pode explicar esse aumento? A explicação para a crescente desses números é o desmantelamento de políticas públicas a mulheres a nível nacional nos últimos quatro anos com o isolamento social causado pela COVID-19. Com a pandemia, houve diminuição no investimento para órgãos que visavam acolher, ajudar e proteger as vítimas, que acabam ficando sem ter onde recorrer, e, consequentemente, ficam presas ao seu agressor.  


Em conformidade com o Anuário de Segurança Pública, em 2023, 07 a cada 10 mulheres foram mortas dentro de suas casas, sendo que 53% foram causadas por parceiros íntimos e 19% por ex-parceiros. Embora a matéria seja sobre violência doméstica, o feminicídio é a consequência fatal da violência em casa, deixando claro a falta de amparo às mulheres brasileiras. Isadora também relatou “Passei por isso por cinco anos da minha vida, sinto que foi um tempo perdido. Aquela pessoa era um atraso na minha vida, mas eu consegui sair dessa, e hoje estou tenho apoio de profissionais que me mostraram que a vida é muito mais do que sofrimento”, diz Souza.

Como buscar ajuda? 

  • Ligue para a polícia: Se você estiver em perigo imediato ou testemunhar uma situação de violência doméstica, chame a polícia. Eles podem intervir para garantir sua segurança. 


  • Ligue para um serviço de apoio: Muitas regiões têm linhas de apoio 24 horas para vítimas de violência doméstica. Esses serviços oferecem apoio emocional, informações e orientações sobre como buscar ajuda. No Brasil, você pode ligar para o número 180. 


  • Fale com amigos e familiares de confiança: Conte sua situação para amigos ou familiares que você confia. Eles podem oferecer apoio emocional e, em alguns casos, ajudar a encontrar soluções temporárias de moradia. 


  • Procure apoio profissional: Converse com um psicólogo sobre sua situação e como curar todos os danos psicológicos causados pela violência doméstica.   

 

Apoio e ajuda 


Souza compartilha que sobre como conseguiu sair da situação de violência. “Eu consegui sair dessa situação com a ajuda de uma vizinha, que percebeu os barulhos de briga dentro da minha casa e chamou a polícia. Ela me tirou daquela situação, me abrigou por cerca de dois meses. Hoje eu não moro mais naquele bairro, me mudei há cerca de quatro anos, mas ainda mantenho contato com aquela vizinha, que teve coragem de me ajudar”, diz. 


Helena Silva, de 62 anos, que também prefere não ter o verdadeiro nome revelado, comenta que não sofreu violência doméstica, mas que vivenciou a violência que sua mãe passava, e foi quem ajudou Souza. “Eu sou uma mulher casada há mais de 40 anos, graças a Deus nunca sofri violência doméstica, mas vi minha mãe passar por isso, é algo que dura há décadas e parece só aumentar. Eu estava percebendo há um tempo que havia algo estranho na casa da Isadora, mas precisava ter certeza, e quando ouvi a briga na casa dela, não pensei duas vezes e liguei para a polícia. Fico feliz de ver os novos rumos que a vida dela tomou, uma moça jovem, bonita e independente. Tenho certeza de que assim como ela, há muitas mulheres que também possam sair dessa situação”, declara.


A violência doméstica é um crime que tem que ser prevenido desde o início da educação, colocando na criação de nossas crianças que a violência nunca é uma opção, principalmente no meio residencial. Ensinar as meninas a nunca aceitar qualquer abuso ou tratamento humilhante e degradante em qualquer tipo de relacionamento. Além disso, é necessário que o governo ofereça mais medidas de proteção para vítimas, que possibilite e ajude mulheres a saírem da situação de abuso que enfrentam na própria casa.  


É obrigação do Estado prezar pelo bem-estar físico e psicológico, segurança e qualidade de vida do povo, principalmente de quem está numa situação de desamparo e violência. Ser mulher no Brasil é viver diante do perigo, onde os direitos estão sempre ao risco de serem proibidos, é viver com uma realidade vinda de um sistema que herdou uma estrutura colonial desigual. Portanto, a violência doméstica é só uma das várias consequências que colocam a vida da mulher brasileira em risco diariamente, e cada vez mais se torna imperioso mais medidas vinda do governo para mudar esse cenário. 



 *A reportagem faz parte da atividade avaliativa da disciplina Jornalismo de Dados e Algoritmos, ministrada pela professora Vanessa Sena, durante o semestre de 2023-2.

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