Tarine Nery - redação portalfalcon.com

A internet, em específico nas redes sociais, transformou-se em um tribunal de julgamentos nos quais, se você não pensa da mesma forma que a maioria, não há lugar para você na sociedade. Artistas famosos são o alvo principal, mas no final das contas, ninguém escapa. Você pode acabar cancelado em grupo de amigos ou por pessoas que sequer conhece. Se você é acostumado a opinar na internet, certamente corre o risco de ser cancelado a qualquer momento.

Nas palavras do dicionário australiano Macquarie, que elegeu a cultura do cancelamento como palavra do ano, o termo captura um aspecto importante do estilo de vida de 2019: "uma atitude tão persuasiva que ganhou seu próprio nome e se tornou, para o bem ou para o mal, uma força poderosa”.

Segundo a psicanalista, Viviane Araújo, o ato de cancelar representa um retrocesso de valores, e aponta falta de maturidade. “Com certeza tem muita infantilidade envolvida nesse processo de cancelamento. Essa ideia de que a sua verdade é a única que vale, leva à intolerância que, consequentemente, leva ao linchamento, quando na verdade o diálogo seria e sempre será a melhor solução”, disse a especialista.

A estudante de psicologia, Nayara Menezes, diz que cancelou quanto foi cancelada na web e ressalta que isso não a prejudicou. “Na internet, nas redes sociais tem muita gente que faz comentários racistas, homofóbicos e racistas no meio digital e social. Eu já tive a infelicidade de fazer um e fui bastante criticada e cancelada no meu ciclo de amizade, mas isso me levou a um processo de entendimento, reflexão. Me mostrou como eu podia mudar meu pensamento e evoluir”, afirmou.

Araújo afirma que nem todos agem da mesma forma que Menezes, levando em consideração que cada indivíduo possui um psicológico diferente. “Algumas pessoas podem enxergar como aprendizado mas outros como exclusão e aí que começa o problema. A depressão é, de fato, a doença do século e esse linchamento virtual, sem dúvidas, é um grande precursor em ascensão dela”, explicou a psicanalista.

A ideia de cancelar alguém tem origem no movimento #MeToo (#Eu Também, em português), campanha online que reuniu testemunhos de mulheres vítimas de crimes sexuais. Encabeçado por celebridades hollywoodianas, o movimento começou em 2017, após a série de denúncias contra o produtor Harvey Weinstein, acusado por dezenas de mulheres de abuso sexual e estupro.

A onda de relatos deu origem a um dos mais sérios cancelamentos nas redes sociais. Não à toa a expressão ‘Me Too’ foi escolhida pelo dicionário Macquarie como a palavra do ano em 2018. "Embora o movimento tenha decolado em 2017 com a hashtag #MeToo, ele definitivamente manteve seu ímpeto e, em 2018, começou a espalhar suas asas linguísticas para além da hashtag e do nome do movimento, respondendo a uma necessidade óbvia no discurso que cerca essa convulsão social", explicou o comitê do dicionário para a reportagem do TechTudo, na época.

No Brasil, a lista de famosos cancelados em 2019 é extensa o tribunal das redes sociais já sentenciou nomes como Anitta, Neymar, Britto Jr. e MC Gui. Em seu Twitter, o usuário @jotagirotto fez uma lista com todas as personalidades canceladas, em processo de cancelamento e "incanceláveis". Ele também acrescentou figuras públicas que foram "revogadas", ou seja, conseguiram reverter o cancelamento, como o youtuber Felipe Neto, famoso por protagonizar polêmicas e disparar comentários ácidos.

Alguns famosos como a cantora Anitta e a empresária Bianca Andrade (Boca Rosa) recentemente foram canceladas nas redes sociais. Os comentários em suas publicações contêm muitas ofensas e quase zero críticas construtivas, reforçando a fala da psicanalista Viviane Araújo sobre a intolerância e linchamento.

De qualquer forma antes do internauta escrever alguma coisa na rede é necessário que tenha extremo cuidado com o que comenta, lembrando sempre de praticar o respeito e a empatia. A internet trouxe possibilidades infinitas de interação e qualquer pessoa pode manifestar sua opinião abertamente, desde que entenda que sempre haverá opiniões divergentes e estas devem ser respeitadas, afinal, a internet não é terra de verdades absolutas.